RELAÇÕES FAMILIARES – A FALTA QUE FAZ FALTA, por Vanessa Torres de O. Ferreira.
A família tem sido objeto de constantes discussões e indagações, seja no campo das ciências sociais, da religião, da psicologia, seja em outras áreas do saber.
A mídia veicula a seu respeito inúmeras fórmulas, métodos, propostas de saída e soluções na tentativa de resolver os impasses das relações familiares.
Desde as conversas informais até as sigilosas sessões de análise, as pessoas estão sempre falando do pai, da mãe, do marido, do filho, dos irmãos, etc.
Avaliada sob diversas óticas no decorrer da história, a família foi alvo de estudos também da psicanálise.
Surgiram algumas questões: – Qual é, então, o lugar da família? – Se o tema das relações familiares sempre esteve presente nas análises individuais e escritos psicanalíticos, seria viável a clínica psicanalítica de casal e família?
A família é um elemento essencial da civilização e permanece exatamente por estar na base da constituição da sociedade, ainda que as “roupagens” com que ela se apresenta sejam as mais diversificadas. Entretanto, sua estrutura se mantém. Quer dizer, os estilos mudam mas a “estrutura família” permanece.
Ao se inserir na linguagem o homem marca uma mudança radical no que se refere às suas satisfações. Não lhe é possível uma satisfação completa, pois além das necessidades, as quais dizem respeito ao instinto e às funções biológicas que podem ser satisfeitas, o homem tem que se haver com desejos.
A busca não cessa e é esse movimento dialético do desejo que impulsiona o homem, tornando-se o motor do seu percurso.
As relações humanas permanentemente submetidas ao mal-estar são caracterizadas por equívocos e desencontros. O ideal de harmonia é impossível de ser atingido. E isso é difícil de aceitar. As pessoas não querem muito saber que a felicidade é relativa e episódica, que os encontros sempre são faltosos e que o amor e as relações familiares não completam e não preenchem.
A Psicanálise não propõe aconselhamento ou orientação. Não se trata de uma ortopedia do desejo. A Psicanálise está engajada na direção de uma “outra cena”, desconhecida, na qual o que se passa não tem a ver nem com as expectativas sociais, nem com a religiosidade, nem com a moral e os bons costumes, porque esta outra cena é o território do desejo inconsciente.
Acolher a demanda de um grupo não significa desprezar o individual – não se deve recuar diante dela, mas dar-lhe tratamento. No dizer de Lacan “o coletivo nada mais é do que o tema do individual”. E a articulação desses dois temas está presente na estrutura do sujeito.
É importante considerar que a Psicanálise é uma só – seja atendendo uma criança, um adulto ou um grupo familiar, os pressupostos básicos que norteiam essa práxis se mantêm.
Observamos que há elementos invariantes que marcam a estrutura da família. Existe sempre a função de pai, a função de mãe e a de filho. É intrínseco ao ser humano fazer laços e esses estarão, inevitavelmente, permeados de mal-estar. Há uma idealização e um desejo de que a família funcione como lugar ideal e de forma harmônica. Mas a falta é constituinte da estrutura do humano. Assim, não é possível que haja perfeição, e a família também vai ser marcada por essa condição.
O que a Psicanálise propõe, então, é que com a introdução do conceito de sujeito, a família possa ser vista não como uma massa, uma simples soma de individualidades, mas como um conjunto aberto, uma coleção de singularidades, em que cada membro possa ser tomado um a um.