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O PSICÓLOGO CRISTÃO SAINDO DO ARMÁRIO, por Alex Rocha, Cristiana Wadt e Deusa Robles

Artigos e Notícias
“Se for macho será Horácio, se for fêmea será Jurema”
“Homem com homem dá lobisomem, mulher com mulher dá jacaré”
“Homem com homem, mulher com mulher, faca sem ponta, galinha sem pé”
Bons tempos aqueles em que tínhamos certezas; mas seriam certezas mesmo ou simplesmente a negação de conflitos para mantermos uma sensação de equilíbrio e controle?
Era tanta certeza vindo de fora para dentro, que não se colocavam as dúvidas de dentro para fora, pois a sociedade não permitiria tais questionamentos sem classificar este conflito como sendo inadequado.
Mas o que fazer com essa questão?
Desde que o mundo é mundo, existem homossexuais, inclusive nas igrejas.
Sentimos a necessidade de estudar este tema, a partir do atendimento de pessoas homossexuais de fé cristã. E não venha me dizer que “…então eles não são cristãos”, pois quem é que julga o coração do homem, hetero ou homo, senão o próprio Criador dos corações humanos?
Independente do tema homossexualidade, quem de nós nunca teve um desejo contrário aos seus próprios valores? Se desejamos mas não realizamos é menos “pecado”? E se for menos, mas mais pertinente na fantasia, faz menos mal para Alma? O que é que nos segura? O medo da mão pesada de Deus? Então que mérito eu tenho? Não enfrento o pecado por que sou covarde?
Depois de alguns cafés, resolvemos procurar dentro da Psicologia Analítica e da Teologia quem já havia pensado sobre tudo isso.Psicologia Analítica
A posição de Jung a respeito da homossexualidade não é muito explícita no decorrer de sua obra, apesar de sua contribuição ser bastante útil a qualquer pessoa que sofra emocionalmente, seja por estar confuso com sua sexualidade, seja por ter de lidar com preconceitos.
Parece-nos que a intenção de Jung não foi a de apresentar teorias definitivas a respeito de nenhum tema, pois ele se propôs muito mais a compreender do que explicar. Desta forma, a importância maior estaria na singularidade.
Segundo Hopcke (1993), as obras completas de Jung existem pelo menos cinco opiniões sobre a homossexualidade e três teorias em aberto. Algumas mais explícitas, outras apenas como comentários de alguns casos atendidos por ele.

Primeira opinião: homossexualidade não deve ser assunto das autoridades legais.
Jung não utiliza aqui teoria psicológica, mas bom senso: “a homossexualidade em si não diminui o valor do indivíduo enquanto membro da sociedade”. Sua posição era uma atitude comum aos psiquiatras do início do século XX.
Segunda opinião: homossexualidade é melhor compreendida quando colocada num contexto histórico e cultural.
Seria um questionamento sobre a função política e social. Jung escreve isto no estudo de caso “O problema amoroso de um Estudante” e na sua “Carta a Werblowsky”. Aqui não há uma tomada de posição homófila ativa, pelo contrário, pois Jung menciona a homossexualidade na Grécia “primitiva” como menos consciente do ponto de vista psicológico.
Terceira opinião: Distinguir a homossexualidade de um indivíduo de outros aspectos de sua personalidade
Nestes comentários Jung vai além do comportamento e sentimentos homossexuais do paciente para examinar outros aspectos do desenvolvimento psicológico, não se atendo como causa merecedora de atenção especial. Aqui, aparece a idéia analítica de se privilegiar o conjunto da personalidade de um indivíduo em relação a qualquer parte dela. O objetivo seria a minimização da importância da homossexualidade de um indivíduo e, conseqüentemente, a colocação em perspectiva desse aspecto da vida de uma pessoa. Não há posicionamento favorável ou contrário.
Quarta opinião: A homossexualidade tem um significado particular para o indivíduo em questão e o crescimento psicológico consiste em tornar o indivíduo consciente deste significado.
Jung mostra que a homossexualidade é tão variável quanto um indivíduo o é em relação a outro; que cada uma dessas várias homossexualidades contém as sementes de um crescimento positivo e também a ameaça de efeitos negativos para a personalidade do indivíduo. Já que ela tem um significado particular para cada pessoa, deve-se enfrentar o desafio de compreender o sentido dessa homossexualidade para cada um e este tomar uma decisão moral sobre como exprimir esse significado em sua vida cotidiana. É um descobrir e tomar consciência, indivíduo por indivíduo, do significado e da razão pela qual alguém deseja homens ou mulheres; uma tarefa a se analisar.
Quinta opinião: a homossexualidade é um resultado da imaturidade psicológica e, conseqüentemente, é anormal e perturbada.
A idéia aqui apresentada é de que a homossexualidade seria identificação com o componente sexual oposto (Anima/Animus) presente dentro de cada ser humano. Esta opinião fundamentou as teorias desenvolvidas posteriormente.
As citações acima sobre a homossexualidade não foram formalizadas por Jung, mas colhidas em cartas e textos de diferentes épocas, o que justifica a falta de complementaridade entre essas idéias.

Além das opiniões, Jung deixa a entender três teorias sobre a homossexualidade:
Primeira teoria: a homossexualidade é quase sempre uma conseqüência de um relacionamento particular com o feminino (Complexo Materno).

A origem desta teoria seria uma dependência mal resolvida em relação à mãe pessoal, fazendo uma identificação com o elemento contrassexual (ânima) de sua personalidade e projetando sua persona para o outro do mesmo sexo.
Embora Jung e os junguianos tendam a ser muito menos severos em seu julgamento dessa dependência, ver a homossexualidade como conseqüência de um problema com o feminino é um eufemismo para julgá-la como imaturidade.

Segunda teoria: A homossexualidade seria um desligamento incompleto do Arquétipo original do Hermafrodito, o estado inato de indiferenciação que precede os outros, tanto no plano mítico como no plano psicológico.
A homossexualidade seria uma forma de coniunctio. Nesta posição, os comentaristas ficam em dúvida se Jung quis dar um valor positivo ou negativo à homossexualidade em sua identificação com o hermafroditismo.

Terceira teoria: homossexualismo inerente, ou seja, uma orientação homossexual determinada por fatores genéticos ou biológicos.
Posição pouco desenvolvida, soa apenas como uma possibilidade para a época.
TEOLOGIA

Na teologia encontramos textos de vários autores. Gostaríamos de destacar dois deles em que baseamos nossas reflexões. São eles: Anete Roese (2005) “Espelho, espelho meu: Há alguém neste mundo mais justo do que eu? – Crítica e autocrítica para um diálogo com o inimigo” e a exposição sobre diferentes visões teológicas da Bíblia, feita por Karl Kepler no I Forum Interno do CPPC (2001).
A autora, Anete Roese, pastora, dita heterossexual, questiona a arrogância dos heterossexuais em falar de uma ferida que, primeiramente não é sua. Em segundo lugar os heterossexuais falam como que de um pedestal de “sexualidade normal”, como se fossem justos e dignos diante dos preceitos e mandamentos de Deus. Assim, ela sugere que a heterossexualidade tire primeiro a trave de seu próprio olho, revendo os pecados de sua postura orgulhosa e arrogante, postura esta que evidencia uma luta por supremacia, poder e dominação.
Em sua interpretação, ela aponta nossos modelos bíblicos, todos heterossexuais e imperfeitos. David com sua impiedade ao assassinar Urias e seu adultério com Bate-Seba. Tendo um companheiro muito íntimo como Jônatas, mas que em nada afeta sua heterossexualidade. Salomão, que segundo a Bíblia, tinha como grande problema as mulheres, que lhe perverteram o coração. O filho de David, Amnon, que estupra sua meio-irmã Tamar, com o apoio de seu amigo Jonadabe. Siquém, filho do príncipe heveu Hamor, ao estuprar Diná, filha de Lia e Jacó. O estupro da concubina do levita (Juízes 19), etc.
Por que homens como Jonas, Jó, Adão e José parecem fracassados? Não fazem parte da lista de heróis bíblicos? Talvez por terem mostrado suas fraquezas e emoções. Anete sugere que seriam estes os modelos mais sadios e íntegros da heterossexualidade.
Não é o caso de tentar inocentar indiscriminadamente todas as experiências da homossexualidade. A autora apenas nos mostra a humanidade pecadora que somos, irmãos e irmãs, independente de sexo e cor. Cita ser necessário desenvolvermos, como cristãos, a capacidade de abertura e acolhimento, com referenciais de reciprocidade e mutualidade entre pessoas de todas as sexualidades, tendo como parâmetro o amor a si e ao próximo, a justiça e o perdão.
Muito importante é o capítulo onde a autora discorre sobre a tentativa dos heterossexuais em domesticar o desejo e a corporeidade do homossexual, forçando-o a uma heterossexualidade artificial, levando-o a uma anulação da plenitude de seu ser. É a “nadificação” do ser, a impossibilidade de desenvolver-se espontaneamente. Se a heterossexualidade é da natureza de todo menino, por que a luta de pais, mães e sociedade em geral para que os meninos se tornem “machos de verdade”, pergunta a autora. Há negação e omissão da família, da igreja e da comunidade. A cultura heterossexual homofóbica abre algumas exceções de abrandamento da exclusão somente para aquelas pessoas que saibam “comportar-se” como se não fossem homossexuais e assim o sujeito vai se tornando hábil para lidar com o jogo das aparências sociais.
Quando teremos disposição e ouvidos para ouvir (Mc 4:3-9) a verdadeira história, a verdadeira experiência das pessoas homossexuais? Talvez seja mais fácil ficar com a história impessoal, a lei, e a justiça caolha que impõe a mesma regra a todos. Somos uma sociedade sexista que não permite afeto entre pessoas de mesmo sexo, por serem “iguais” e proíbem também relações de amizade entre mulheres e homens, por serem “diferentes”.
A violência instaurada culturalmente contra homens e mulheres homossexuais permite que a lógica do medo e da ameaça controle a sociedade e mantenha a divisão e a diferença hierárquica de gênero. Somos lembrados pela autora, que “Deus me demonstrou que a nenhum ser humano considerasse comum ou imundo (At 20:28)” , aprendendo a fazer o bem, instaurando a justiça, reprimindo o opressor e defendendo o direito daqueles de quem o direito foi roubado (Is 1:17), acolhendo o estrangeiro, o diferente, permitindo a comunhão daquilo que em mim é contraditório, revelando o próprio estranho que há em mim, que me povoa ocultamente ou o que de mim se perdeu, por isso me dá angústia e medo. Queremos o igual, o mesmo, a uniformidade, mas esta é contrária à natureza criativa de Deus.
A autora nos convida então a irmos a Nínive. A nos tornarmos nós mesmos sendo capazes de ir ao outro, ao diferente. É pedido a Jonas antes de ir a Nínive que enfrente sua Nínive interior.
O ministério de Jesus foi marcado pela transgressão de limites impostos pela religião, pela sociedade e pela cultura. Jesus instituiu um novo tempo, um tempo de novas relações. Ele não expulsou a samaritana (Jo 4) e a Cananéia (Mt 15), perdoou a mulher adúltera (Jo 8), invadiu a plantação de trigo quando teve fome (Mc 2), não respeitou o sábado quando era necessário curar (Mc 3). Jesus justamente olhou para a diferença. Porque Deus se revela de muitas formas, porque sua casa tem muitas moradas (Jo 17).
Transgredir estes limites, vencer a fuga perante o encontro com a pessoa que é homossexual é aquilo a que nós heterossexuais somos enviados. Mas temos primeiro que nos tornar nosso ser verdadeiro, tornando-nos cada vez mais “ser humano”. É na descoberta de si mesmo que vai nascer o cuidado do outro. Retornar à nossa humanidade, à nossa natureza e à de Deus, para voltar ao que é o próprio eixo, centralidade e integridade. Nínive nos mostra um caminho de volta à humildade.
E a autora, enfim, cita que existe cura. Cura para toda a sociedade heterossexual que endureceu seu coração e perdeu sua capacidade de discernimento. Ela mesma precisa recuperar sua imagem e dignidade perdidas. Onde não há paz, não há cura. Para tanto é necessário:

1) Aceitação incondicional;
2) Fortalecimento pessoal, com elevação da auto-estima da pessoa, lembrando que enquanto uma pessoa lutar para ser o que não é, em sua mais profunda intimidade e interioridade, não haverá cura. Um cuidado terapêutico da espiritualidade de cada ser, irá resgatar o dom, a vocação de cada pessoa em sua singularidade como criatura de Deus;
3) A integração e o fortalecimento mútuo de um grupo de afinidade;
4) Processo de reintegração com a família, amigas e amigos;
5) A inclusão na sociedade (local de trabalho, escola, igreja) e grupos de apoio.

A autora termina dizendo que a cura é um processo de aceitação e de inclusão. A cura é a cura do preconceito, da exclusão e da negação. A cura é re-ligar relações que foram rompidas. Ajudar as pessoas a refazer relações, a refazer seu cuidado pessoal através da auto-aceitação, guiá-las no seu caminho em busca da dignidade concedida por Deus.

Já na exposição de Karl Kepler do primeiro Fórum – e mais detalhada neste II Fórum, vemos que existem dois pólos de interpretação da Bíblia, em torno dos quais as diferentes visões vão se agrupando, em diferentes graus:

1. Conservador: considera a Bíblia como Sagrada, focada na idéia da Verdade e guardada com cuidado para não a transgredir ou deturpar. No seu extremo, Deus teria ditado a Bíblia linha por linha, e é importante seguir o texto literal sem considerar o contexto histórico-cultural. Este pensamento é predominante nos evangélicos brasileiros e norte-americanos, e no seu extremo encontram-se também os cristãos fundamentalistas, politicamente de direita e que têm aversão a mudanças, combatem o aborto, defendem a tradição, família e desta maneira têm raiva dos homossexuais e acreditam que estes são pecadores abomináveis.

2. Liberal: baseada na idéia da Graça total de Deus, considera a Bíblia como um documento histórico e no seu extremo, seus adeptos não vêem problema em questionar, relativizar ou mesmo discordar dos seus ensinamentos. Tendem a tomar a responsabilidade social em suas mãos. Jesus seria um mártir da solidariedade com os oprimidos que nos deixou exemplo para ajudar os necessitados, presos, famintos e marginalizados, neste último estão incluídos os homossexuais.

Segundo a visão conservadora de Gênesis 1.26-28, a sexualidade em função da procriação é vista como “natural”, levando à rejeição qualquer outra forma de sexualidade que não tenha este objetivo. Encontramos então, no mesmo nível da homossexualidade práticas como o coito interrompido, masturbação, entre outros. Só o que é considerado “natural” pela tradição, estaria de acordo com a vontade de Deus.

Já segundo a visão liberal, não há razão objetiva para considerar a homossexualidade uma perversão da suposta “verdadeira” sexualidade, pois encontraremos a perversão em cada uma delas. O pecado e a Graça não residem na natureza da relação, mas na forma como pode vir a ser exercida.
Segundo a dinâmica da Interpretação Liberal, não haveria nenhum problema teológico em admitir como legítima a relação homossexual contanto que fundamentada nos princípios de amor e justiça. Assim sendo, no que devemos nos basear enquanto cristãos, é na verdade de nosso coração, numa boa consciência e na verdadeira fé em Cristo.
É preciso considerar que dentro de cada uma das Interpretações Bíblicas, Liberal e Conservadora, existem várias possibilidades de interpretações, desde os fundamentalistas até os mais livres.
Como, então, poderemos julgar ao próximo? Karl nos lembra que Jesus Cristo consegue unir a Graça e a Verdade (Jo 1.17). Em seu texto “O Homossexual de Romanos 2” (CPPC, Psicoteologia, ed. 29) também apresentado no I Fórum, ele diz que todos os pecados, incluindo a homossexualidade, são oriundos do nosso próprio coração. Acusar, julgar quem quer que seja, revela que nossos corações são tão ruins como qualquer outro pecador: os pervertidos, os invejosos e inclusive, os homossexuais. O autor cita: “a diferença quanto ao nosso nível de comprometimento, deve-se apenas à Graça de Deus que nos segura e à Bondade de Deus que nos reaproxima do arrependimento”.

ASSIM, DEPOIS DE MUITOS CAFÉS…

Foi possível abaixar nossa ansiedade e pretensão, para só então reconhecer e ocupar o verdadeiro lugar de psicoterapeuta, que é aquele que acompanha a busca interior de seu paciente e testemunha a dor e o regozijo de seu caminhar, procurando sempre não permitir que nossos próprios valores interferissem nessa procura.
Ser terapeuta não é persuadir. Etimologicamente, no grego, a palavra “terapeuta” demonstra a intenção de cuidar e não a de curar. Assim sendo, independente de seus valores espirituais, culturais, morais, o psicoterapeuta deve suportar, deixar vir, os conteúdos inconscientes, sejam quais forem.
Não cabe ao psicoterapeuta trazer uma idéia pré-concebida para que o paciente se encaixe nela, pois isto já é exatamente o que a sociedade, inclusive a igreja vem fazendo com a pessoa homossexual.
O objetivo da psicoterapia é, na verdade, auxiliar a pessoa a buscar, com autonomia, a compreensão de sua própria alma (consciente e inconsciente).
Em linguagem teológica, diríamos: se cremos que “conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará”, temos de agüentar nossa angústia e permitir que ele, o paciente, descubra a Verdade em sua caminhada singular, o que traria mais sentido do que uma interferência externa.
Não é possível iniciar uma psicoterapia já com um objetivo definido. Não há como direcionar a ação do inconsciente, nem mesmo a de Deus, que “é vento, ninguém sabe de onde vem ou pra onde vai”.
Nos parece que ser psicoterapeuta cristão é estar submetido às condições de um Deus que participa da terapia, muitas vezes até direcionando-a, quando psicoterapeuta e paciente conseguem não atrapalhar.
Ainda assim, encontramos outra questão: a própria onipotência do psicoterapeuta. Será que, de fato, confiamos que o paciente possa descobrir os caminhos internos, ou que realmente precisa receber a verdade de fora, da mão do psicoterapeuta?
Quem somos nós, para dizer que a sombra do outro é mais feia que a nossa própria?
Ninguém é capaz de classificar o que é certo ou errado para a vida de cada um. O papel do psicoterapeuta é de ouvir, acolher com amor, para poder refletir o outro e com o outro, em cima dos valores e convicções do outro e não seus, ou seja, é trabalhar exatamente como trabalhamos com qualquer outro conflito.
Há certos padrões pré-existentes em algumas parcelas da vida, assim sendo, nascemos homem ou mulher, em uma família ou em outra. Acreditamos que desejar homem ou mulher não é uma escolha.
Acompanhamos várias pessoas em psicoterapia, com desejos homoeróticos, que buscaram durante anos, em orações, vigílias, libertações, psicoterapias com objetivo de se tornarem heterossexuais, até mesmo mantendo abstinência por longos períodos e mesmo assim, não conseguiram ter seus desejos sexuais alterados. Chegaram em nossos consultórios sentindo-se oprimidos, rejeitados por Deus, culpados, deprimidos e incapazes de vivenciar a vida.
Algumas dessas pessoas nos têm dito: “Meu desejo não é escolha, se pudesse eu escolheria ser hetero”.
No decorrer destas terapias, analisando seus conteúdos inconscientes, por exemplo através de seus sonhos, pudemos constatar que seus desejos inconscientes continuavam homoeróticos, apesar de toda a culpa e repressão.
Quando o psicoterapeuta acompanha sem julgamentos ou direcionamentos, o paciente homossexual pode olhar para o próprio desejo e ao entendê-lo como involuntário, sente sua culpa diminuída, podendo então olhar para a Graça de Deus.
O olhar do psicoterapeuta deve estar sobre a pessoa e não sobre os seus conflitos; e considerando inclusive, a visão teológica que a Graça transforma e reina, sem julgar a homossexualidade como prática nem pecadora, nem libertadora.
A partir deste momento, o psicoterapeuta pode ajudar a pessoa a desobstruir uma passagem do rio, ainda que não consigam mudar o fluxo do rio.
É sabido que há vários relatos de ex-homossexuais, principalmente no meio cristão, entretanto, nossa experiência em consultório tem se mostrado diferente.  Algumas destas pessoas que pudemos atender em psicoterapia obtiveram uma “cura pessoal” saindo da compulsão sexual e da promiscuidade, podendo manter vínculos afetivos mais profundos, até mesmo com um relacionamento amoroso com um único parceiro também homossexual. Outros, optaram pela abstinência sexual, mas sem imposição ou data marcada.
O que temos considerado como o mais importante é que a pessoa volta a ter dignidade, sai da transgressão/promiscuidade e/ou depressão e adquire maturidade para fazer suas escolhas com responsabilidade.
Muitas vezes foi possível perceber na pessoa homossexual, em especial a cristã, muita dor por não ter sido aceita por sua família de origem, por seu meio social, pela sua imagem da aceitação de Deus e enfim por sua igreja, que ela própria acaba por não se aceitar.
Nos parece comum, então, que o homossexual apresente uma cisão entre amor e sexo, não conseguindo obter afeto e prazer sexual na mesma pessoa, daí a rotatividade entre parceiros. O indivíduo com desejo homoerótico busca ser aceito e amado pelo outro, obtém prazer sexual com o outro, mas esse mesmo prazer lhe trás culpa. São duas pessoas feridas no amor e na auto-estima, não conseguindo projetar sua possibilidade de inteireza no outro.
Pensamos que é esse o grande conflito que nos cabe ajudar a desvendar, e não os desejos sexuais da pessoa. Isso será naturalmente reconstruído, na medida em que a possibilidade de amar e ser amado for sendo restaurada. Então devemos, como psicoterapeutas, estar abertos para o “devir” de cada um. Isto é psicoterapia e não aconselhamento. É ajudar o outro a descobrir suas possibilidades e limites para viver a vida o mais plenamente possível. Só é possível ser um bom psicoterapeuta se enxergarmos a alma da pessoa que nos procura para ser ajudada. Se tentarmos enxergar nossa alma naquela, estaremos traindo ao outro e a nós mesmos como profissionais.
Não é uma questão de não tratar sobre a homossexualidade. É tratá-la com muito mais profundidade. É ver a pessoa homossexual que nos procura como um paciente como os outros, com questões da vida a serem vistas e elaboradas. É trabalhar com os conteúdos da psique homossexual, com seus sonhos e símbolos e ir, pacientemente, como um artesão, resgatando cores, vivências, dores – sombra e luz – para, que juntos, o homossexual possa ir redescobrindo-se como indivíduo; como uma pessoa inteira, aceita e amada por Deus, não por seus próprios méritos, mas única e exclusivamente pela Graça que, felizmente, a todos nós é dada.
Referências:

HOPCKE, Robert. Jung, Junguianos e a Homossexualidade. São Paulo,
Siciliano, 1993.
KEPLER, Karl. O Homossexual de Romanos 2. Revista Psicoteologia,
publicação do CPPC, Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos,  ed. 29.
ROESE, Anete; SCHEUNEMANN, Arno. Homossexualidade, Conjugalidade e
Violência. São Leopoldo: Oikos, 2005;

 

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