Aprendendo a perfeição do Pai – Quadro Bíblia Conselheira
“Sejam perfeitos” (Mt 5.48).
Ser perfeito, aqui, não é no sentido costumeiro de ser “correto” — isso os códigos humanos já nos ensinavam. Jesus coloca o nosso Pai do Céu como sendo o padrão, portanto ser perfeito significa “deixar de agir segundo nosso olhar e passar a agir com o coração do Pai”, e enfatiza também a integridade, a verdade transparente desde o coração. Derramar chuva sobre bons e maus ou sol sobre justos e injustos dá a ideia de ser perfeito no sentido de “uma ação que prega um universo em harmonia”, como era no início. Lucas registra na mesma passagem o termo que foi traduzido por “ser misericordioso” ou “generoso”, que tem na raiz a ideia de gerar vida. A ação do Pai gera vida, sem discriminar ninguém!
Qual o segredo?
Nos Evangelhos há um convite constante para sairmos da ordem da realidade externa — a das coisas e da aparência — para uma realidade interna, que nos faz sentir a vida com o coração de Deus (“Deus amou o mundo tanto, que deu o seu único Filho”, Jo 3.16). Por isso, aqui no Sermão do Monte somos convidados a não mais nos comportarmos com as categorias visíveis, aquelas que separam família de não família, amigos de inimigos, pessoas que nos fazem favores de pessoas que não nos favorecem. Ou seja, o evangelho não é um código de boas maneiras ou etiqueta que aprendemos na família humana, mas algo bem diferente, que modifica esse aprendizado.
O pecado da reciprocidade
Jesus condena algo bem humano: a reciprocidade, o tratar o outro como ele me trata — isso parece tão inocente e tão correto! Só que a reciprocidade faz a gente basear nossas relações sobre nós mesmos: a quem faz bem, eu faço bem. Ela omite “nada menos do que a relação interna do homem com Deus”, como diz Michel Henry.
A relação com Deus tem como cerne a não reciprocidade: “amem os seus inimigos… e serão filhos do Deus Altíssimo. Façam isso porque ele é bom também com os ingratos e maus” (Lc 6.35-36). A essência de Deus é a não reciprocidade, a generosidade. Portanto ela será uma marca daqueles que reconhecem sua condição humana fundada na relação com ele.
Reconhecer que minha vida vem de Deus é sair da reciprocidade
“Façam o bem… Emprestem e não esperem receber de volta… e serão filhos do Deus Altíssimo”; “orem pelos que perseguem vocês, para que vocês se tornem filhos do Pai de vocês, que está no céu” (Lc 6.35; Mt 5.44).
Jesus nos convida a sair da dimensão da visibilidade, que fazia essas separações, para sentir os outros com o coração do Pai, que não faz esse tipo de categorização: Nosso eu já não deve se definir por essas coisas — família, status, membresia de igreja, etc… — mas simplesmente pela relação com Deus como nosso Pai.
“Para que vocês se tornem filhos do Pai… ele faz com que o sol brilhe sobre os bons e sobre os maus e dá chuvas tanto para os que fazem o bem como para os que fazem o mal” = obras do Espírito com todos: já não depende de quem a pessoa é, mas depende do Pai de quem sou filho e filha! Esse relacionamento com o Pai — e o desejo de tornar-se parecido com ele — faz mudar!
Mas como colocar isso em prática?
Apenas tendo Jesus Cristo como exemplo, bem como a biografia de cristãos e cristãs (os mártires de todos os tempos, por exemplo)? Não.
Ao olharmos para nós mesmos, percebemos que nossa vida nos é dada na não reciprocidade — Deus nos trata assim. Portanto, é para Deus como nosso Pai que devemos olhar: ele não retribui com mal o mal que lhe fizemos; ele nos dá quando pedimos; ele nos dá sol e chuva, mesmo quando somos maus. A nossa vida depende da não reciprocidade de Deus! Somos filhos de Deus porque ele nos criou, gerou e perdoou!